terça-feira, 29 de maio de 2012

Pecados ligeiramente mortais

Há uns quantos anos atrás, andava eu entusiasmado com  a criação teatral, um crítico, o saudoso Manuel João Gomes (Deus o guarde em bom lugar), depois de assistir à estreia da peça da minha autoria, "Quantos dias faltam para que ontem faça parte do futuro", disse a alguém, que depois me contou, que não percebia se eu era comunista ou fascista.

eu e o Julião a observar o "Principezinho"

Ontem, enquanto montávamos esta singela exposição, intitulada "Pecados ligeiramente mortais", o Dear Zé (ali na foto comigo) ironizava com a minha possível veia católica, ou coisa que o valha.


Já não sou nenhum adolescente, caraças, e, no entanto, as coisas que exponho continuam a deixar uma imagem difusa de mim próprio. Penso que isso se deve ao facto de considerar que os objectos que produzo (que produzimos) são diferentes daquilo que sou (que somos), embora, por vezes, possamos ser confundidos uns com os outros, os homens com os objectos que criam. E vice-versa.

eu e o Ivo a montar a exposição

No fundo, no fundo, pensando um pouco sobre o assunto, concluo que não passo de um provocador. Se há coisa que temo é que o resultado do meu trabalho possa deixar os espectadores (os observadores) indiferentes. Por isso, quando crio uma imagem, tento fazer com que seja algo parecido com uma pedrada, um grito nos ouvidos ou então, mais suavemente, que seja um momento de suspensão e comunhão entre quem vê e aquilo que é visto.

o Julião, o Miranda e a minha careca em plena actividade

 Tenho por verdadeiro que os objectos não existem a menos que sejam vistos. Uma coisa pode estar ali e, caso não seja olhada, é como se não estivesse. Existe, não existindo. Mas, quando o observador se apercebe do objecto e o olha, então o contacto tem de ser efectivo, violento, de preferência. A coisa tem de mexer com o ser humano, caso contrário não merece ser coisa, arrisca-se a não ser quase nada.

o Zé Luís, o Julião (de copo em riste) e a Paula Rosa em pleno esforço de montagem

"Pecados ligeiramente mortais" é um conjunto de 13 trabalhos recentes (10 colagens em photoshop e 3 pinturas-colagens). Estão ali, na Parede, para serem vistos e pretendem interpelar o observador. Os títulos sugerem sentidos de leitura mas, o verdadeiro significado de cada um daqueles objectos está dentro de quem os observa.

"Olha-me este idiota" uma das peças expostas
É só isso.

As fotos são do Paulo Nunes, um cidadão exemplar, e as molduras emprestou-mas o Zé Julião, outro cidadão que ultrapassa largamente a exemplaridade.

7 comentários:

Li Ferreira Nhan disse...

Puxa como eu queria ver!
Olha Rui sou um desastre na escrita (entre outras muitas coisas) . Sempre venho aqui, olho, olho e não comento. Já te escrevi; receio estragar tudo.
Hoje na leitura do teu registro fotográfico da exposição encontrei as palavras.
Impossível ficar indiferente com tuas colagens; sem chance não sentir as pedradas. Nada como um empurrão ou uma boa sacudida nas cabeça, no coração!
E ir do 8 ao 800, quando se perde o chão de tamanha a suavidade, a leveza, a "suspensão".
Nos teus escritos tb é assim.
Não te conheço, além do que se passa por aqui nos blogs, mas acho que há uma mistura, uma troca entre o criador e a obra. No teu trabalho o resultado é essa maravilha que na maioria das vezes me deixa sem fala.

Te desejo um ótima exposição!
Obrigada por partilhar as imagens!
Um brinde a você!


Ah, e um brinde ao "dear Zé"
;)

Silvares disse...

Grato pelas tuas (belas) palavras. Eu desenho e pinto e faço colagens no computador, uma e mais outra e outra. Vou acumulando imagens, pequenas histórias, narrativas visuais. Algumas nunca chegam, a sair de casa, outras têm a felicidade de olhar em volta, lá fora. Nada que me preocupe, mas sinto-me bem quando deixo algo pendurado numa parede e venho embora. Gosto de imaginar que aquelas histórias se vão transformar noutras, muito diferentes, nas cabeças de quem vê. 100 cabeças, 1000 cabeças...

:-)

O Zé é um amigo dear, como é bom de ver.
:-D

Anónimo disse...

Silvares,

muito sucesso é o que desejo de verdade! Sinto que estas feliz com a mostra, e isso me deixa contente também! Seu trabalho merece.

Silvares disse...

E sentes muito bem Eduardo. Estou contente.
:-)

Jorge Pinheiro disse...

Eu acho que somos sempre vagamente putos. E qd se cria isso vem ao de cima. Gostei muito do que vi e vou tentar lá ir. Até qd fica exposta?

Silvares disse...

Jorge, as exposições na Parede costumam ter uma duração de um mês. Esta será desmontada a 25 de Junho ou a 2 de Julho, as desmontagens (e montagens) são sempre às 2ªs feiras.

Chapa disse...

Fico feliz que te tenhas encontrado, mesmo que com uma prosaica idade é sempre interessante concluir que és uma espécie de provocador fascisto-comuna, coisa certamente rara e muito criativa (como podemos ver pelas amostras incluídas no belogue.